Brasil entrega presidência do T20 à África do Sul após avanço inédito em recomendações para o G20

 

Após um ano dedicado a discutir e apontar caminhos concretos para solucionar os principais problemas globais, o Brasil formalizou nesta terça-feira (12) a transferência da presidência do T20, grupo de engajamento do G20 composto por think tanks e instituições de pesquisa dos países membros, para a África do Sul, que conduzirá os trabalhos em 2025. A liderança brasileira do T20, coordenada pelo Centro Brasileiro de Relações Internacionais (Cebri), pela Fundação Alexandre de Gusmão (Funag) e pelo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), se caracterizou pela entrega, em julho, do Communiqué aos líderes mundiais, documento com recomendações elaboradas por seis forças-tarefa temáticas.

Com essa ação inédita, os integrantes do T20 puderam discutir, ao longo do segundo semestre, meios de implementação dessas políticas públicas. O foco, a partir de agora, é intensificar esse debate para que as propostas sejam retomadas com um nível ainda mais avançado de maturação nas próximas lideranças do G20/T20, destravando os recursos necessários e alinhando esforços para atingir os Objetivos de Desenvolvimento Sustentável (ODS) e os compromissos climáticos estabelecidos pelo Acordo de Paris.

"O governo brasileiro abriu um bom espaço de interlocução entre os grupos de engajamento, como o T20, e os sherpas. Agora, a expectativa é que nosso trabalho esteja representado na declaração final do G20. Fizemos uma bela transição para a África do Sul e continuaremos contribuindo com o T20. E já começamos a nos preparar para o T30, um grupo de think tanks que será coordenado pela ex-ministra Izabella Teixeira, pensando nos trabalhos da COP30", antecipa Julia Dias Leite, diretora-presidente do Cebri.

O segundo dia da Cúpula T20 Brasil, realizado esta terça-feira no Palácio do Itamaraty, no Centro do Rio, contou com a fala de abertura da ex-presidente do Chile Michelle Bachelet. Em seu discurso, Bachelet ressaltou que os problemas que afligem hoje a humanidade não podem ser resolvidos por nenhuma nação isoladamente. É preciso, segundo ela, que entidades multilaterais como a Organização das Nações Unidas (ONU) sejam fortalecidas e que a democracia seja defendida. Bachelet chamou a atenção para a necessidade de inclusão nos projetos que buscam soluções para os problemas globais.

"Sabemos o que deve ser feito, mas a má notícia é que temos que trabalhar sobre uma série de problemas ao mesmo tempo, para termos um sistema global mais inclusivo. Isso envolve pensar em segmentos específicos, como a juventude, que precisa de empregos. É preciso ainda abordar a desigualdade de gênero. As mulheres são mais afetadas pelos desastres, e ainda não recebem a mesma remuneração de homens. Quando as mulheres são empoderadas, as sociedades são mais estáveis", defende Bachelet, que foi primeira de subsecretária-geral e diretora-executiva da ONU Mulheres e, também, alta comissária das Nações Unidas para os Direitos Humanos.

Ao longo de todo o ano, o T20 reuniu diferentes vozes e forças: think tanks nacionais e internacionais, membros da academia, representantes dos setores público e privado e da sociedade civil. No seu último dia de atuação sob a presidência do Brasil, o grupo sediou ainda as sessões finais de trabalho, abordando temas como “Combatendo desigualdades, pobreza e fome" e “Ação climática sustentável e transições energéticas justas e inclusivas".

A agenda oficial do T20 terminou com a cerimônia oficial de transferência para a África do Sul. Para Elizabeth Sidiropoulos, chefe executiva do Instituto Sul-Africano de Assuntos Internacionais, um dos desafios deste país na presidência do G20 será garantir a sua manutenção como um fórum que una o Norte e o Sul. Ela ressaltou a necessidade de um entendimento entre todos, mesmo entre aqueles que não estão de acordo sobre determinados pontos. É importante, ressalta, que as perspectivas de cada um sejam compreendidas para a construção de uma visão comum.

"Em termos das questões que vamos levar adiante, haverá muita continuidade na construção das áreas social e de desenvolvimento. Isso é muito importante para a África do Sul, muito importante para o Brasil e, de fato, tem sido muito importante para todos os membros do G20 que fazem parte do Sul Global. O próximo ano também será, digamos, particularmente desafiador, pois acredito que o cenário global, em termos de disposição e vontade política para cooperar internacionalmente e apoiar processos multilaterais, provavelmente será ainda mais testado pelos acontecimentos", analisa Sidiropoulos.
 

Olhares sobre o T20:

DIVERSIDADE - “O T20 Brasil deixa um legado de participação, com uma diversidade muito desejada por nós. Afinal, num mundo onde há tantos conflitos, a cooperação entre think tanks, como a que aconteceu no T20, produz consensos que são importantes para o diálogo interno em seus países e podem ajudar a avançar em alguns consensos entre as lideranças mundiais”. - Luciana Mendes Santos Servo (Ipea)

TRANSIÇÃO ENERGÉTICA - “Ainda somos muito dependentes de combustíveis fósseis. No entanto, uma transição justa e equitativa não é um processo simples e linear, e depende de aceitação da sociedade. Além disso, não há uma solução única para todos: é preciso reconhecer a realidade de cada país. Mas a proporção de investimentos em combustíveis fósseis e renováveis tem melhorado, mostrando que estamos na direção correta”. - Clarissa Lins (Cebri)

FINANCIAMENTO CLIMÁTICO - “Sabemos que a emergência climática chegou para ficar, e, no Brasil, temos o desafio de financiar ações de adaptação para essa realidade. Em parceria com o Governo Federal, incluindo os Ministérios da Fazenda, do Meio Ambiente e da Indústria, o BNDES desenvolveu uma plataforma para conectar projetos brasileiros com fontes de investimento internacionais. Já temos US$ 1 bilhão em projetos”. - Cláudia Prates (BNDES)

PRIORIDADES - “Cada uma das três últimas reuniões teve características únicas. A da Indonésia, por exemplo, foi muito impactada pela pandemia, então as prioridades eram promover o crescimento e conseguir cooperação na área de saúde. Na Índia, a voz do Sul Global foi muito forte, nos convidando a pensar sobre essas posições. Agora, no Brasil, os tópicos têm impacto tanto interno, como o alívio da pobreza, quanto externo. As forças-tarefa podem variar, mas alguns temas estão sempre lá: comércio, transição digital, ação climática e transição energética e a reforma do multilateralismo e governança global”. - Embaixador Marcos Caramuru (Cebri)

SUSTENTABILIDADE - “As questões sociais e de sustentabilidade estão interligadas, mas ainda não impactam em como pensamos no desenvolvimento e em como devemos nos mover para obtermos o tipo de crescimento que buscamos, mais inclusivo e sustentável. Precisamos de uma visão mais complexa da economia, que vise o aumento da qualidade de vida não só humana e não humana”. - Gala Diaz (Centro para a Implementação de Políticas Públicas que Promovem Equidade e Crescimento - Cippec)

VISÃO HOLÍSTICA - “Precisamos reler o que está na agenda 2024, uma vez que a ONU e seus membros concordaram em abordar temas econômicos, ambientais e sociais sob a mesma lógica. São muitos desafios diferentes, mas que precisam ser abordados no mesmo movimento. É uma agenda holística: combatemos a fome enquanto abordamos a desigualdade de gênero. É difícil, mas esse é o nosso desafio.” - Damien Barchiche (Instituto para o Desenvolvimento Sustentável e Relações Internacionais - Iddri)

COOPERAÇÃO - “A presidência do T20 pela Indonésia teve foco na agenda do Sul Global, tanto das nossas necessidades domésticas como aquelas de outros países, buscando aprender uns com os outros. No Rio, vimos discussões sobre a implementação das recomendações feitas na Indonésia. Tratamos de temas diferentes, mas as questões debatidas aqui dão insights para o futuro do T20, em um processo contínuo de colaboração.” - Riatu Mariatul Qibthiyyah (Universidade da Indonésia)

PLURALIDADE - “Na presidência da Índia do T20, trabalhamos com o viés de que quanto mais vozes são ouvidas, mas democráticas são as políticas desenvolvidas. As forças-tarefa são um espaço de conversa franca, onde podemos ambicionar a Lua no que tange às soluções que queremos ver o G20 implementar. Quando as ideias são repetidas por grupos diferentes, elas ganham força.” - Jhanvi Tripathi (Fundação de Pesquisa Observer- Índia)
 

T20 Brasil - Números e dados

Participantes:

- Para garantir a representação e participação dos países-membros do G20 no T20 Brasil, o Comitê Organizador convidou think tanks e instituições de pesquisa desses países para integrar seu Conselho Consultivo Internacional, com 26 instituições.

- Reconhecendo a importância de incluir instituições de todo o Brasil, além dos centros econômicos e políticos do Rio de Janeiro, Brasília e São Paulo, o Comitê convidou 32 instituições para integrar o Conselho Consultivo Nacional.

- Considerando essas 58 instituições consultivas, as 121 organizações que compõem as 6 forças-tarefa e as 3 que integram o Comitê Organizador, o núcleo do T20 Brasil reúne 182 instituições.

115 instituições de 27 países confirmaram presença no T20 Brasil Summit

Diversidade regional

- Seguindo princípios de inclusividade, representatividade e eficácia, as 182 instituições centrais do T20 Brasil são regionalmente diversas:

- 20 instituições de 9 países da África

- 24 instituições de 7 países da Ásia

- 24 instituições de 9 países da Europa

- 90 instituições de 7 países da AL (72 deles do Brasil)

- 16 instituições de 2 países da América do Norte

- 8 instituições globais

 

Fonte: ipea.gov

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